domingo, 3 de fevereiro de 2013

Entrevista - Luisa Geisler

Boa parte dos escritores que estão na luta para publicar seu primeiro livro ou disputando os bons concursos literários do país sabem quem é a Luisa Geisler. Ela, bastante jovem, conseguiu a façanha de vencer o prêmio SESC de literatura na categoria conto. Não satisfeita, ganhou no ano seguinte na categoria romance, fazendo com que a organização do prêmio SESC mudasse as regras para o caso de aparecer outro escritor com o mesmo talento e precocidade por aí querendo repetir esta fabulosa conquista.

Tive a oportunidade de conhecer a Luisa pessoalmente no Forum das Letras 2012 em Ouro Preto após a debate Como Publicar o primeiro livro?. Não tivemos a chance de conversar pessoalmente o quanto eu gostaria, pois ela teve de atender aos seus outros leitores e o debate seguinte começou cedo demais. Mas ela, muito solicita, me passou seu contato e agora trago a vocês uma pequena entrevista com esta autora que começou sua carreira da maneira mais destacada: vencendo por duas vezes um concurso do mais alto nível, lançando seus livros por uma editora como a Record e participando da seleção dos 20 melhores jovens escritores brasileiros da revista Granta.

Agradeço a Luisa por dividir um pouco de sua experiência conosco. Aproveitem as dicas e conheçam os livros da autora: Contos de mentira (contos) e Quiçá (romance).

Luisa, antes de mais nada, muito obrigado por conceder esta entrevista ao blog Papolivro.
Imagina! :) Todos os blogs literários são bem-vindos.

1) Sabemos um pouco da sua trajetória a partir da vitória no prêmio SESC com o livro Contos de mentira. Mas como as coisas correram para você antes disso em relação a literatura? Já publicava em jornais, revistas ou blogs? Participava de outros concursos literários?
Então, antes do Contos de mentira, eu escrevia muito pra mim mesma. Participei de alguns concursos de contos, alguns públicos, mas nada chamativo. Cheguei a ter blog, mas nunca fui boa com a manutenção. Comecei a escrever mais a sério e cogitar a carreira de escritora quando comecei uma oficina de criação literária com Luiz Antonio de Assis Brasil, na PUC/RS. Daí foi quando me empolguei de verdade com o processo.

2) Já participei de uma oficina de contos aqui em BH, e parte dos contos que tenho prontos em casa foram produzidos lá. Acho que essa é uma das maiores vantagens de frequentar uma oficina: a gente passa a ter uma espécie de "pressão" para produzir algo e levar a oficina na semana seguinte, além de conseguir uma critica especializada para o texto. Alguma parte dos contos que compõem o "Contos de mentira" foi produzida ou aperfeiçoada em oficinas como a do Assis Brasil, que você frequentou?
Sem dúvida. Diria que 50% dos contos que estão no Contos de mentira passaram pelo crivo do Assis em algum momento. A pressão pra escrever (que se torna ritmo) foi um aprendizado essencial. É comum a gente procrastinar, esquecer, priorizar outras coisas... mas quando tem um prazo, uma meta, a responsabilidade se torna mais forte. É bem comum a figura da pessoa que gosta de escrever, mas não escreve.

3) Como funciona o seu processo criativo? Tem algum método? Se considera uma escritora produtiva?
Pra escrever, sou bastante rápida. Mas a revisão, em geral, demora o dobro do tempo. Costumo brincar que só começo meu texto quando ponho o ponto final. Meu método é algo estilo:  ter noção da história — planejar — executar. Às vezes, em alguns contos, sou bem mais livre, escrevo sem planos, sem nada, só escrevo. Com romances, em geral, sou bem cdf e não gosto de escrever do nada.

4) A construção de um romance, na minha opinião, é um trabalho que nunca acaba. Sempre podemos trabalhar mais o texto, ou incluir novas reviravoltas na trama. Você também pensa assim? E se concorda, quando considera que um livro seu está pronto e é hora de parar de trabalhar o texto?
Sempre brinco que eu nunca poderia me suicidar: a carta de suicídio nunca ia ficar pronta. Adoro revisar, adoro repensar possibilidades e achar problemas do texto. Muitas vezes “trabalhar mais o texto” significa tirar excessos, tirar reviravoltas, simplificar as coisas. Nem sempre, mas às vezes. Está pronto na hora em que não tenho mais ninguém pra me dar uma opinião externa sobre o livro, porque todo mundo já leu duas ou três versões. Depois disso, não tem mais o que fazer. Tendo lido o livro duas ou três vezes, já conheço tanto a história que nem vejo mais os problemas. Não é uma avaliação justa. Acho que daí é hora de parar.

5) Em relação aos seus livros publicados, você contratou alguém para um serviço de leitura critica, ou convidou leitores de sua confiança para um feedback? Acha importante esta primeira leitura?
Muitas vezes, as pessoas me enviam romances achando que eu tenho uma opinião que preste, quando na verdade, eu sou uma leitora normal. Acho excelente a contratação de um leitor crítico, porque eles dão atenção para detalhes que os leitores comuns nem sabem. Além de terem uma noção do mercado literário e poderem ajudar nesse sentido. Eles podem, por exemplo, te trazer dicas sobre quais editoras seriam mais apropriadas pro material. Não contratei nenhum serviço de leitura crítica (mais por falta de dinheiro do que de vontade), mas tentei compensar com um bom processo de edição na Record. Ainda acho que meus livros têm muito a melhorar, mesmo depois de impressos. Confio muito nesse tipo de trabalho e acho que ajuda muito na construção de um projeto coeso.

6) Quanto ao relacionamento com a editora, muitos autores mostram insatisfação com os trabalhos de edição realizados ou com a capa do livro, por exemplo. Mas sabemos que a editora, como toda empresa, precisa ter lucros, e por isso tem sempre a intenção de colocar o melhor produto possível no mercado, pelo menos do ponto de vista comercial. Como você vê esta relação?
Acredito que é importante que o autor esteja muito atuante no processo de criação de seu livro como produto, seja capa, seja edição. Mas ao mesmo tempo, um livro é um produto caro (de produzir, de colocar na livraria, de propagandear), num mercado difícil, e a editora não pode ser a única culpada de tudo. Uma editora confiável faz, no mínimo, um bom trabalho de edição, de conversa com o autor sobre o conteúdo e a abordagem do livro. Há outros detalhes que fogem um pouco disso, como capa (questões de designer etc), e com isso o autor precisa ter cuidado.

7) Como foi a experiência de ser um autor nacional estreante em uma editora grande como a Record?
Editoras grandes dificilmente apostam em autores iniciantes. Fiquei encantada. Recebi um tratamento muito bom, em especial por causa do Prêmio SESC de Literatura. Só tenho a agradecer.

8) Você acha que um autor que tenha sido rejeitado em várias editoras comerciais deve tentar a autopublicação? Ou o fato de ter sido rejeitado várias vezes pode indicar que talvez o livro (e talvez também o escritor) não estejam ainda maduros para iniciar uma carreira?
Acho que deve, mas também vale a pena investir um pouco em outras coisas. Muitas vezes, a publicação não é o mais importante. Vale a pena investir tempo em blogs, revistas literárias e, principalmente, prêmios e bolsas que publiquem (ou financiem). A autopublicação é um processo caro, muitas vezes apressado, que nem sempre tem bons resultados. Qualquer estímulo externo compensa mais nesses casos. Contudo, não acho que ser publicado ou não revela maturidade. A publicação não precisa ser o primeiro passo na carreira do escritor.

9) Algumas editoras, como Novo Século e 7Letras, tem um formato híbrido de publicação, onde o autor banca apenas uma parte do custo da publicação, e a editora faz todo o trabalho editorial e comercial, garantindo qualidade e a distribuição do livro. O que você acha deste formato?
Acho um formato que vem crescendo muito recentemente, mas minha opinião se mantém próxima à resposta anterior. Nem sempre publicar um livro é a melhor opção. Não desestimulo, mas acho que é uma decisão que deve ser pensada e planejada. Há muitas oportunidades pra escritores iniciantes por aí, vale mais a pena garimpar.

10) Gostaria de deixar alguma dica para aqueles que estão lutando para publicar o seu primeiro livro e querem começar com o pé direito?
Acho que… dizer que o primeiro livro é o passo mais difícil. Não fica mais fácil a partir dele, mas é o passo mais difícil. É uma droga estar nesse limbo entre “tenho um livro na gaveta” e “sou escritor”. Ou seja, ouvir negativas (ou, pior, nenhuma resposta) é a regra, não a exceção. Meu conselho seria: vá com calma.

11) Já está trabalhando em um novo livro? Pode adiantar algo para os leitores do Papolivro?
Sim, estou, mas... não posso adiantar. Tenho o mau hábito de profetizar sobre livros que não acontecem.

12) Luisa, obrigado por responder a esta entrevista e dividir um pouco de sua experiência conosco.
Imagina :) (de novo). Estamos aí!

Pessoal, não deixem de conhecer o trabalho da Luisa Geisler. É muito importante para quem quer publicar conhecer os livros que estão chamando a atenção no mercado nacional. Seria quase como uma "pesquisa de campo".



Thiago Rulius.